Archive for fevereiro, 2006

Talvez não, Truman

fevereiro 28, 2006

O último filme que vi e falava sobre o processo criativo de um livro foi “As Horas”, aquele, do nariz da Nicole Kidman. É muito bom, mas fica nos lugares-comuns dessas histórias: cigarro, agonia, loucura, deslocamento. “Capote” fala sobre a criação de “À Sangue Frio”, clássico instantâneo da literatura contemporânea, que mudou a forma de se fazer romance, escrito pelo jornalista Truman Capote.


Ele, morador de Nova York, culto, egoísta, egocêntrico, megalômano e colaborador da revista New Yorker, era também autor e tinha passe livre nas altas rodas da metrópole. Chamava atenção onde quer que fosse, e ainda mais na pequena cidade no interior dos Estados Unidos onde se passa a trama, principalmente por um motivo: era gay assumido. Na década de 50 isso era muito mal-visto, ainda mais com os trejeitos, voz fina e afetações que Capote demonstrava. Mesmo hoje seria motivo de chacota e risos abafados.

Falar da atuação de Philip Seymour Hoffman nesse filme já é padrão. O ator (que, pra quem não se lembra, era o cara do aparelho o enfermeiro do velho moribundo em “Magnólia”) encarna o personagem de forma mediúnica. Philip copia tudo, inclusive os tiques nervosos. Li que ele continuava a falar e agir como Capote mesmo fora do estúdio! É fantástico.

Outros atores estão muito bem nesse filme. Destaco Catherine Keener, como a amiga e também escritora Nelle Harper Lee (autora de “To Kill a Mockingbird”) e Clifton Collins Jr., no papel de Perry Smith, um dos dois assassinos. Certamente ele mereceria o Oscar de ator coadjuvante, mas sequer foi indicado.

Numa manhã, Capote viu a notícia do assassinato de uma família no Kansas e resolveu cobri-la para a New Yorker. Chegando lá, decidiu que aquela não era uma simples história e poderia se tornar um livro. Com a ajuda de Lee, de sua fama e de sua inteligência, conseguiu fazer contatos e chegar aos então já conhecidos assassinos. Ele cria uma relação com os dois e, em especial, com aquele que teve infância parecida com a sua.

Percebemos o estilo do jornalista. Ele mentia para quem fosse necessário mentir, sofria com o caso dos assassinos e depois bebia uísque com seus amigos abastados em Nova York, era muitas vezes dissimulado. Truman passou a viver o conflito de querer salvar os condenados à pena de morte e, ao mesmo tempo, desejar ver seu livro terminado com o desfecho mais emocionante — o que aconteceria apenas quando a dupla fosse morta na forca. Isso fica muito claro quando Nelle responde, depois dele dizer que não poderia ter feito nada para salvá-los: “Talvez não, Truman. Mas a verdade é que você não queria fazer nada”.

A previsão de que “À Sangue Frio” se tornaria um sucesso e mudaria os rumos da literatura estava certa. No entanto, Capote não imaginou que ele próprio se destruiria, depois de anos em dedicação exclusiva para escrever o livro, e não conseguiria terminar mais nenhuma obra. Aquela foi a última de sua prodigiosa carreira.

Aconteceu na Praça Roosevelt

fevereiro 27, 2006

Da janela do apartamento de uma amiga eu poderia ficar horas e horas praticando a flaneurie, ato de observar a cidade ao redor, sem a pretensão de analisar nada, sem a idéia de tirar conclusão nenhuma, sem pensar muito. Simplesmente observar. A vista permite espiar as vidas das pessoas do prédio em frente devido aos enormes janelões, e mais ao fundo, à direita, pode-se também observar uma torre de concreto que surge em meio às copas de uma porção de árvores. Aquela é a praça Roosevelt, um dos maiores ícones da degradação urbana do centro da cidade.

Até alguns anos atrás eu não tinha relação nenhuma com aquela praça. Pra ser mais sincero, nem sequer sabia que ela existia. O mais próximo que eu já havia estado dali era no teatro Cultura Artística, pagando caro por ingressos para ver peças elitistas e de qualidade duvidosa. Mas nunca havia reparado que ali ao lado havia uma praça. Para mim era apenas mais um beco escuro e feio do centro velho. “Não passe por aqui” minha consciência certamente diria.

Mas essa imagem começou a mudar há aproximadamente três anos, quando eu estudava algo sobre a trilogia tebana de Sófocles na faculdade, em uma dessas matérias não-tecnicistas que a maioria dos alunos nunca entendia o porquê de estudar. Interessado no assunto, pesquisei em meu onipresente Guia da Folha, descobri que estava em cartaz a peça ‘Antígona’ em um teatrinho minúsculo ali nas imediações da República e da Consolação. Procurei no guia e descobri que o teatrinho ficava naquele beco feio e escuro, e que esse beco feio e escuro era na verdade uma praça, e que se chamava Franklin Roosevelt.

Aquela montagem foi também meu primeiro contato com a companhia de teatro Os Satyros, até então desconhecida para mim. O segundo contato veio muito mais rápido do que eu imaginava: na época eu tinha um blog onde havia postado minha crítica elogiando a montagem e, para minha surpresa, alguns dias depois chega em minha caixa de entrada um e-mail de Ivam Cabral, um dos fundadores da companhia, agradecendo por nossa visita. “Fui eu quem atendeu vocês na bilheteria.” Ivam nos convidava para assistir à então nova produção da companhia, ‘A Filosofia na Alcova’, que acabei vendo muito tempo depois.

Mas desde a primeira peça comecei a observar (e depois acompanhar) melhor aquele espaço, e a assistir suas montagens sempre que possível. E percebi que aquele teatrinho abafado e apertado no meio da boca do lixo é na verdade um dos mais importantes pólos teatrais do Brasil, seja pela qualidade de suas montagens, pela originalidade de seus temas e processos, seja pela diversidade – não conheço nenhum lugar onde haja tantas montagens diferentes ao mesmo tempo, sempre com uma qualidade que não encontramos na maioria dos teatros da cidade – voltados para montagens fúteis em sua maioria. Considerando as dimensões dos dois espaços dos Satyros (o segundo espaço funciona há algum tempo na mesma praça Roosevelt), isso é realmente impressionante. A acessibilidade também é algo que precisa ser levado em conta: raras vezes paguei mais de dez reais para ver algo por ali.

Ontem finalmente foi a vez de ver ‘A Vida na Praça Roosevelt’, que ainda não havia conseguido assistir. O texto, da dramaturga alemã Dea Loher para o Thalia Theater de Hamburgo, é um verdadeiro estudo antropológico sobre os personagens que habitam a praça e não havia companhia mais adequada para realizar a montagem brasileira do que os Satyros.

Dea passou algum tempo observando as pessoas e a dinâmica da praça para escrever uma peça que tinha como tema “Terra de Ninguém”, a convite de seu amigo Alfons Hug, curador da Bienal de São Paulo. O resultado foi um drama melancólico, riquíssimo e despretensioso, que conta as tristes histórias de pessoas que vivem ao redor da praça: travestis, mendigos, policiais, traficantes, operários e todos os outros personagens que podemos facilmente encontrar no submundo de todos os grandes centros urbanos ao redor do planeta.

E no fim das contas, na próxima vez que eu observar da janela da minha amiga a torre da Igreja da Consolação, em meio às árvores daquele canto escuro, sujo, degradado e perigoso da cidade, me lembrarei de que existe muita vida na praça Roosevelt, graças a estes três últimos anos acompanhando a atividade teatral daquele pedaço e sobretudo à peça que vi ontem.

The next big thing

fevereiro 25, 2006

Todo mundo sabe que a imprensa musical que importa (inglesa e americana) adora descobrir a próxima nova grande promessa. A aposta hoje atende pelo nome Arctic Monkeys. Ontem à noite, a banda “fez história” no NME Awards, da pouco-tendenciosa-e-seguidora-de-modas New Musical Express. Desde 2000 vários grupos são hypados, alçados à posição de salvação do rock e… esquecidos em seguida. Exceções que provam a regra: Strokes e Franz Ferdinand.

Sim, há alguns meses comprei o single deles. Sim, também já baixei o CD. Sim, é jeitosinho. No entanto, não vale tudo aquilo que 3 em 3 críticos estrangeiros têm dito. Aliás, eles disseram o mesmo sobre Maximo Park, Keane, Killers, Kasabian, Futureheads, Kaiser Chiefs, Libertines, Bloc Party, Babyshambles…

E pensar que o melhor disco de 2006 até agora, segundo o Metacritic, é “Tropicalia: A Brazilian Revolution in Sound”. Os Mutantes vão dominar o mundo rock.

Aventurinha

fevereiro 22, 2006

Terça-feira, 19h30, eu ainda na agência por causa do rodízio, os dois autores do blog conversávamos pelo MSN:

– Um pessoal aqui da agência vai tentar ir ao show do U2. Eu preciso ver aquele show de novo. Tá afim?
– Como assim?
– Parece que ontem, depois que o show começou, os cambistas tavam vendendo por 50 reais, pro ingresso não morrer na mão deles.
– Ok, estou saindo daqui agora.

No caminho, apareceram caixas eletrônicos de todos os bancos, exceto daqueles em que tínhamos conta. Tudo bem, uma amiga disse que sacaria dinheiro extra e nos emprestaria assim que nos encontrássemos em frente ao estádio. Ao chegar em frente ao estádio, deparamos com milhares de pessoas que tiveram a mesma idéia. Toca o celular.

– Oi Ju, onde você tá?
– Mau, to indo embora.
– Como assim?
– Meu, tá muita muvuca, a gente não vai conseguir entrar.
– Ok.

Então, ali, parados e sem dinheiro, decidimos voltar, e ainda tivemos que desembolsar uma grana prum flanelinha filho da puta (porque TODO flanelinha é filho da puta e tem que morrer de diarréia). No caminho, ainda tomando cuidado pra não atropelar ninguém nas imediações do estádio, toca o celular novamente. Era um amigo que havia sido convidado e havia declinado:

– E aí, conseguiram?
– Não.
– Hahaha, que ridículo!

Ok, foi ridículo, reconheço. Mas pelo menos vi o show de segunda…

Antropologia da Rede

fevereiro 21, 2006

Me desculpa, mas agora eu vou usar uma frase conhecida e soar batido: “Um dia todos terão direito a 15 minutos de fama”, disse uma vez o pintor/performer/desenhista/pop Andy Warhol. Quando isso foi dito não existia a Internet, ou pelo menos ela não existia nesse formato comercial como a conhecemos.

Depois da Internet, todos tivemos direito a nossos minutos de fama, em maior ou menor grau. Tudo começou com os sites pessoais. Eu tive uns dez e adorava fazê-los. Naquele distante 1997 eu achava o Geocities superlegal e imaginava me tornar um webdesigner, veja só. Então o tempo passou e surgiram blogs, flogs, podcasts… e o Orkut.

Tá todo mundo no Orkut. Os que não estão, esses têm a senha de alguém, acessam e sabem o que se passa por lá. Logo, esse site tornou-se pródigo em criar e hypar eventos, coisas, personagens e, principalmente, pessoas. No comecinho da comunidade não era bem assim, mas do ano passado pra cá vimos celebrizações instantâneas a rodo: Bruno Chateaubriand, Pedremo, o assassino da Rádio USP, a vítima da Rádio USP, Klaus Pinto Pequeno, etc. etc.

Agora a maior celebridade de todas é Katilce Miranda. Até ontem ela era uma reles bancária de Volta Redonda, fã do U2. Hoje ela é “a garota que beijou o Bono”. Há meia hora ela tinha 163986 scraps. Neste momento ela tem 174922. Hoje à tarde, 50 mil. Ontem à noite duvido que chegassem a 900. Existem várias comunidades em sua homenagem, ou talvez não.

Recontagem: 177202 recados.

Que podia ter sido e que não foi

fevereiro 17, 2006


O que você foi na sua vida passada? Eu fui um monge copista na Idade Média e, à noite, escrevia poemas. Uma amiga foi florista holandesa, dois outros conhecidos foram trabalhadores numa mina na Romênia, uma colega era mago (sim, mudou de sexo) e o Maurício, monge copista também. Ah! E ainda tem um outro que foi filósofo na Grécia, antes de Cristo. Esse demorou pra reencarnar. Pelo menos é o que diz um site por aí. Todo mundo foi alguma coisa, invariavelmente, e todas as coisas são minimamente interessantes.

Faça o teste. A probabilidade de você ter sido um camponês ferrado, que morreu de tifo aos 27 anos, é nula. Também é próxima de zero a possibilidade de você descobrir que foi atingido pela peste negra antes dos 6. É por essas e outras que continuo acreditando apenas no Tarô de Marselha.

K * (1 + i)n

fevereiro 15, 2006


Há um tempo li o best-seller “Pai Rico, Pai Pobre”. Sim, é um livro de auto-ajuda financeira mas minha antiga chefe o havia recomendado. Concluí, com o fim da leitura, que o autor é um cara de sorte: investia em ações de 20 centavos que passavam a valer 20 dólares um ano depois, comprava imóveis que valiam 70 mil dólares por 50 mil e os vendia em dois anos por 100 mil. Um sucesso.

Após absorver todos os ensinamentos passados, decidi que a estrada para a independência financeira e a não-necessidade de trabalhar é feita de apenas uma coisa — obstinação. Caso você ganhe 2500 reais, deverá gastar 500 e guardar os 2000 que restam. Mensalmente.

O Excel me provou * que em seis anos terei mais de 210 mil reais. Por sua vez, este dinheiro gerará um fluxo de caixa mensal de 2100 reais. Assim, conseguirei lucro suficiente para investir os dois mil ao mês sem por a mão no bolso. É uma bola de neve que se transforma na verdadeira roda da fortuna!

Não é tão difícil.

* Considerando-se retorno de 1% a.m. líquido, desconsiderando-se a inflação e possíveis falhas de mercado ou crises econômicas, que são bastante incomuns no capitalismo — ainda mais quando se trata de longos períodos analisados.

Syri… o quê?

fevereiro 13, 2006


Syriana – A Indústria do Petróleo é o típico filme Tela Quente: governos corruptos, tema atual, explosão, carros legais, finanças globalizadas, morte. Faltou as mulheres bonitas em trajes sumários, mas não há espaço para elas no Oriente Médio e muito menos no roteiro cheio de histórias paralelas pouco desenvolvidas. Bem desnecessário.

Adendo. Continuo a repetir que Matt Damon tem cara de Matt Damon em qualquer filme que ele faça. Não importa se ele é um Gênio Indomável, funcionário de banco de investimentos na Suíça ou ladrão internacional. Tem sempre a mesma cara.

Mais cinema…

fevereiro 10, 2006

O oriente médio parece ser mais uma vez o centro das atenções no universo do cinema alternativo, dito “de arte”. Só esta semana assisti a três filmes em cartaz que retratam os conflitos entre árabes e judeus, e isso me dá um referencial interessante para poder comparar as três obras.

O primeiro deles, Munique, não chega a ser um filme alternativo, afinal trata- se de uma megaprodução de Steven Spielberg. Conta a história de um grupo de agentes secretos israelenses designados a promover uma série de atentados contra os terroristas árabes que executaram 11 atletas israelenses nas olimpíadas de Munique.

O filme mostrou-se razoavelmente maduro, eu diria surpreendente por tratar-se de uma obra de Steven Spielberg. Logicamente o ponto de vista judeu que a trama adquire por narrar o lado israelense da história acaba fazendo com que os inimigos árabes sejam caricatos e estereotipados, mas esse nem é o grande problema.

O que realmente peca em Munique é o tempo. Os acontecimentos parecem ocorrer no momento errado, cedo demais ou tarde demais. Por exemplo, tenho a sensação de que se Avner – o protagonista – começasse a questionar a natureza de suas ações antes, ou ainda mais: se ele começasse a ficar paranóico bem antes, o fluxo do tempo no filme seria mais coerente. A impressão que tenho é que houve uma certa calma durante o filme todo – muitos disseram que havia calma até demais – e nos últimos minutos, houve uma necessidade de se acabar o filme, acelerando os fatos, com uma pressa que culmina na cena mais desnecessária e constrangedora do filme.

O que estraga o filme para mim foi a cena em que Avner transa com sua mulher pensando nos atentados em Munique. Para mim aquela cena beira a grosseria, a impressão que tive é que ele estava depositando em sua mulher toda a fúria e o desgosto que ele carregava dentro dele. E pior ainda, quando a mulher, submissa e avoada, olha para ele e diz “te amo”, como se o que tivesse ocorrido ali fosse a coisa mais linda deste mundo. Um desperdício de película que faz um filme bom acabar com uma cena péssima como essa.

O segundo filme que vi foi Paradise Now, obra palestina que narra a história de dois jovens comuns, que levam suas vidas comuns, até que são designados pelo grupo político e religioso de que participam a se sacrificarem como mártires em um atentado a bomba em Tel Aviv. Num primeiro momento, eles estão conformados com a idéia, mas depois perdem a segurança quando começam a questionar se aquele ato realmente valia a pena – e mais, se realmente haveria um paraíso aguardando por eles, como prometido. E o questionamento mais interessante é: como esse ato pode ajudar a causa palestina?

Um ótimo filme, sobretudo se imaginarmos que trata-se de uma produção palestina! Saber que aquela terra de tanta miséria e tanto sofrimento consegue ainda assim gerar artistas e pensadores faz pensar que eles ainda podem ser vistos pelo resto do mundo como mais do que apenas um monte de gente miserável aglomerada se matando por terra.

O terceiro e último filme que vi foi Free Zone, do israelense Amós Gitai. Conta a história de três mulheres, uma israelense, uma árabe e uma americana, que se relacionam em um território neutro, de livre comércio entre todos os povos no Oriente Médio, independente de suas origens e religiões. Chatíssimo, maçante, sonolento, mas não deixa de ser um bom filme. Mas que eu não veria de novo.

No geral, ambos têm uma característica em comum: nenhum é fundamental, todos eles são facilmente esquecíveis – ficarão carinhosamente armazenado na gaveta das vagas lembranças em meu cérebro – mas todos são boas fontes de referência para se aumentar a bagagem cultural sobre a questão do oriente médio e geram algum tipo de questionamento. Se tiver que recomendar algum, fico com Paradise Now.

TFP

fevereiro 9, 2006

E ontem a prefeitura fechou a Galeria do Rock. Na última semana foram fechadas algumas baladinhas também. Em comum, todas são (eram) freqüentadas por roqueiros, indies, mini-punks, gays, emos, alternativos e todo tipo de gente estranha. As razões para as autuações ficaram no roteiro “segurança-prostituição-barulho”.

Imagino que o senhor aposentado e a senhoura viúva dos Jardins não gostem da algazarra dos jovens que vão ao Atari, por exemplo. Então, no sábado à noite, cansados do tumulto, ligam para o Psiu e dormem felizes.

– Ei, mas não tem muita gente morando perto da Galeria!

Pode ser mania de perseguição, mas é muito estranho que esses lugares sejam sempre o alvo de denúncias. E mais: tudo acontece num pequeno espaço de tempo. Será que a prefeitura teve um acesso de moralização? Há muitos bares espalhados por cantos distantes da cidade que, com certeza, não funcionam dentro da lei. Por que os funcionários do Psiu não vão na periferia fechá-los?

Começo a acreditar que existe uma população ávida por higienização na cidade. Então o governo fecha baladas ditas sujas, cria rampas anti-mendigo e instala o regime da igreja, família e tradição. Toda cidade precisa de lugares feios freqüentados pela juventude. Senão seríamos um grande Higienópolis, com suas árvores, cachorros, idosos e prédios cult caríssimos.