Archive for agosto, 2006

Se você está errado, eu estou certo

agosto 30, 2006


Vou direto ao ponto: “Obrigado por fumar” é um ótimo filme. O diretor Jason Reitman trouxe para o cinema um livro homônimo de 1994 escrito por Christopher Buckley que basicamente ataca os lobistas — sinônimo de trabalho em Washington.

Nick Naylor é o homem que defende os interesses da indústria do tabaco nos Estados Unidos e, para isso, conta pequenas verdades, manipula e usa seu poder retórico. No meio disso tudo tem-se piadas no ponto certo e frases inspiradas. “A beleza de um debate é que, se você argumentar de maneira correta, você nunca está errado”, diz o protagonista ao filho. Praticamente Schopenhauer para crianças.

Os Sertões – O Homem I, do pré-homem à revolta

agosto 27, 2006

Uma semana de ansiedade depois de ter visto A Terra, ontem finalmente foi a vez de O Homem I, segunda parte da encenação do livro Os Sertões de Euclides da Cunha, realizada pelo Teat(r)o Oficina Uzyna Uzona e dirigido por Zé Celso.

Semana passada eu achava que o Oficina era a experiência teatral mais visceral que eu já havia visto na vida, e ontem tive certeza absoluta disso. Eu precisava ver pelo menos mais um espetáculo para confirmar, de preferência um que não narrasse apenas a geografia do sertão brasileiro, e o que eu vi ontem já foi suficiente. Mais que isso, é o suficiente para passar mais uma semana ansioso para ver a próxima parte e para ter certeza de que eu terei pique para assistir a epopéia euclideana até o fim.

Mais uma vez o gigantesco elenco nos surpreendeu logo na entrada. Esperando que, assim como na semana passada, fôssemos recebidos lá na rua por uma espécie de escola de samba, estranhamos quando os seguranças nos pediram para formar uma fila. Ao passar pela porta, a surpresa: o teatro inteiro, elenco e público, brincando de roda, cantando Ciranda Cirandinha. Mal entrei e uma pessoa do elenco já estendeu o braço, puxou a minha mão e, em questão de poucos segundos, lá estava eu atravessando a gigantesca passarela do Oficina cantando, dançando e brincando de roda até chegar até o lugar onde queria me sentar.

Um pouco menos alegórico, um pouco mais ilustrativo e narrativo, O Homem I fala sobre o surgimento do povo brasileiro, da mistura dos europeus, índios e negros, em uma sintetização excelente da história da colonização brasileira. Além disso, nos transporta para a realidade do Brasil sertanejo, das crenças populares, das festas regionais, de um mundo que sabemos que existe, achamos que conhecemos mas que a maioria de nós tem certeza de que nunca verá pessoalmente. Para mim, o ponto máximo foi a grande festa sertaneja com direito a dança, pinga e competições.

Em suma, sempre ouvia as pessoas dizerem que as muitas horas das peças do Oficina passavam rápido, e eu nunca acreditava, mas ontem as cinco horas de espetáculo realmente passaram como se não fossem muito mais que uma hora. E o que mais me deixa impressionado é o brilhantismo, a precisão e a grandiosidade de tudo, é necessário um talento e uma dedicação absurdos para adaptar, produzir e dirigir algo tão megalomaníaco, com tantos atores, tantas histórias, tantos detalhes e tantas nuances, e sempre com tão grande qualidade e de uma forma tão atraente, tão apaixonante. E José Celso Martinez Corrêa consegue fazer este teatro de uma forma sublime. E isso é uma das maiores provas de que aquele velho maluco é um gênio.

E no fim de semana estarei lá de novo para O Homem II…

Sai Helô, volta Aninha

agosto 27, 2006

Mistério não-resolvido, nossa heroína foi demitida e nossa musa retomou seu trono.

Cinema, parte 3

agosto 27, 2006

No terceiro post seguido sobre cinema, quero comentar que o Festival de Curtas está muito bom. Hoje o dia estava quente, com um belo sol e pessoas caminhando pela Paulista. Qual a melhor opção, fora ir ao bar? Assistir a alguns curtas. Abaixo, sinopses do que vi.


“O poeta dinamarquês”, de Torill Kove (Noruega/Canadá) é uma animação muito simpática que fala sobre as coincidências da vida. “Sr. Malikai em guerra contra o avião”, de Drew Blatman (EUA) é praticamente um conto fantástico que bem poderia ter sido escrito por Júlio Cortázar. “Mesmo que ela fosse uma criminosa…”, de Jean-Gabriel Périot (França) se trata de um quase-documentário sobre um episódio bastante específico da história francesa e posso dizer que foi feito basicamente com trabalho de edição.

Na lista de filmes bizarros à sua maneira, incluo “A última ficha”, de Heng Tang (Austrália), “Proteção”, de Christos Nikoleris (Grécia) e “Tatana”, de João Ribeiro (Moçambique).

Entre outros, está em cartaz “Nunca como da primeira vez”, de Jonas Odell (Suécia), que vi há algumas semanas no Anima Mundi, e mais centenas de títulos. A mostra é gratuita e vai até o dia três, em vários endereços.

O coração ainda está batendo

agosto 27, 2006

Um homem jovem está no melhor momento da carreira. É bonito, namora, chama atenção, é um pouquinho egoísta e hipoteticamente invencível. Descobre ter câncer e que o tempo médio de vida restante em casos como o seu é três meses.


François Ozon disse que a morte é uma obsessão antiga, que era fascinado pela idéia quando criança. Resolveu fazer uma trilogia sobre o tema, da qual “O Tempo que Resta” é o segundo filme. Romain é o personagem do parágrafo e da foto acima.

A fuga do clichê é quase impossível numa história que trata da proximidade da morte e nessa produção não é diferente. Claro que não temos um personagem chorando (o tempo todo) pelos cantos, abraços ou frases de gosto duvidoso, mas o contraponto entre morte e nascimento está lá, pulsante.

Esse contraponto é o mote principal e, dele, surge uma relação interessante entre alguns personagens. Fora isso, Romain é perseguido por lembranças da infância e por um certo sentimento de “preciso resolver algumas pendências”. A coincidência é que estava pensando nisso — no que eu gostaria de fazer caso descobrisse que teria pouco tempo de vida — nessa semana. Claro que também só me lembrei de clichês.

It’s over

agosto 26, 2006


Muita gente já passou por processos de seleção para entrar numa empresa. Em geral analisam o currículo do candidato, o chamam para fazer prova, entrevistas e a famigerada dinâmica de grupo. Em “O Que Você Faria”, o diretor argentino Marcelo Piñeyro tranca sete personagens numa sala e trata dessa etapa tão comentada.

O filme mostra como as pessoas brigam por uma vaga e levam em conta unicamente seus objetivos. Não importa o quão boa seja a máscara, rapidamente ela cai. Novidades? Talvez apenas para o próprio Marcelo, que declarou nunca ter participado de experiência parecida.

Qualquer um que fez dinâmica (ou mesmo quem leu manuais do tipo “como se portar em dinâmicas”) já conhece e sabe o que esperar dos ensinamentos da produção. No fim, descamba para um quase-panfletarismo misturando tudo com o apoio à causa sindical e comentando um protesto contra o FMI e o Banco Mundial. História tão custosa quanto as provas pelas quais os personagens tiveram de passar.

Os Sertões – A Terra

agosto 21, 2006

Fazia anos que eu não me conformava de nunca ter visto nenhum espetáculo do Teatro Oficina Uzyna Uzona, do maluco (e genial) José Celso Martinez Corrêa. Afinal sempre ouvi de todo mundo que todas as pessoas que gostam de teatro, fazem teatro e estudam teatro tinham obrigação de assistir a pelo menos alguma das cinco partes da adaptação do Oficina para Os Sertões de Euclides da Cunha. Mas os espetáculos que chegam a ter 8 horas de duração sempre me intimidavam.

Ontem, aproveitando que o Oficina está apresentando “Os Sertões – Obra Completa”, venci essa timidez e fui assistir “A Terra”, primeira e mais curta parte da epopéia. Se eu gostasse, tentaria assistir às demais. Saí do teatro e fui pra casa achando excelente. Hoje não consegui parar de pensar sobre o que vi ontem, e me dei conta de que foi um dos momentos teatrais mais catárticos que já vi na vida.

Pra começar, o começo. Ingressos na mão, muvuquinha esperando a equipe abrir a porta, destacar os ingressos, se sentar e aguardar a peça começar. Ingenuidade pura. Num instante, do outro lado dos portões, uma batucada altíssima revelada pela porta que se abre. Ainda não é hora da platéia entrar: todo o gigantesco elenco vem, com suas batucadas e suas danças, alegres, passam pelo meio do público boquiaberto, sem reação. Vão até a rua receber com muita cantoria o público que foi até lá para vê-los, para então entrarem todos juntos e dançando no gigantesco teatro em forma de passarela.

As quatro horas que se seguiram foram espetaculares, no sentido mais literal da palavra. Após um alongamento e um aquecimento de corpo, voz e a alma, estávamos submersos na transposição para o teatro da descrição geográfica que Euclides fez sobre a região de Canudos: relevo, hidrografia, vegetação, fauna… Este aspecto também torna alguns momentos cansativos, mas torna o espetáculo ainda mais nobre, pois não há forma mais sincera de se transcrever um livro para outra linguagem do que respeitando-o na íntegra, inclusive suas partes menos teatralizáveis.

Tudo o tempo todo no mais absoluto clima de festa, com muita música, muito canto, muita dança, muita alegoria, sempre contando com a participação ativa do público. Como bem constatou uma amiga, em alguns momentos parecia um barracão de escola de samba, mas era teatro, em um dos formatos mais generosos que já vi na vida. E esse clima de festa não anula também o clima ritualístico presente o tempo todo no teatro de Zé Celso, fazendo de “A Terra” um grandioso e autêntico culto a Dionísio.

Sai Aninha, entra Helô

agosto 18, 2006

Os comentários antigos desapareceram. Para solucionar este mistério, Aninha sai de cena temporariamente para que a genial Helô possa investigar.

A Prova

agosto 14, 2006

Mais um filme da recente safra de peças teatrais adaptadas para o cinema, baseado no texto de David Auburn ganhador do Pulitzer de 2001. Conta a história de Catherine, uma jovem matemática filha de um gênio também matemático, e que abdica de sua promissora carreira para cuidar do pai após sua loucura. Três anos depois, com a morte de seu pai, ela sente que a semelhança entre eles vai além da profissão: ela acredita ter herdado a doença.

No dia após o enterro, atordoada pela presença insuportável da irmã e apaixonada por um jovem professor discípulo de seu pai, ela faz uma revelação: um estudo brilhante que comprova alguma coisa que os matemáticos do mundo todo buscavam comprovar há muito tempo (alguma coisa a ver com números primos, aqueles que eu nem lembrava que existiam). Porém, Catherine está confusa demais com a perda recente e com a suposta doença para conseguir se lembrar claramente se tal prova foi escrita por ela ou por seu pai.

O texto em si é fortíssimo, riquíssimo. Mas se perde com a adaptação para o cinema, basicamente pelo uso excessivo de flashbacks, recursos extremamente elegantes no teatro, no cinema ficam confusos e cansativos. Mas apesar disso, ainda sim trata-se de um grande filme.

"Sou amigo da Ida Feldman."

agosto 14, 2006

Esta era a senha para entrar na festa que aconteceu sábado no casarão do século XIX onde está sendo gravado um filme de terror, lá na praça Roosevelt. Acreditamos que o código se tratasse de uma brincadeira, uma piada intena ou algo no gênero. Ao chegarmos (em uma turma considerável), nos deparamos na porta com dois seguranças e uma mulher.

– Boa noite. Nós somos todos amigos da Ida Feldman.
– Ah são, é?
– Somos!
– Eu sou a Ida Feldman!
– Ah é??? Hum… Você se lembra de mim?
– Eu não.
– …
– Como vocês ficaram sabendo?
– Pelo e-mail da M. F.
– Ah, tá. Então podem entrar.

Lá dentro, um de nós ouve a anfitriã comentando com alguém:

– Nossa, chegou uma turma enorme que eu não conheço, dizendo que eram meus amigos!